quinta-feira, setembro 04, 2014

Capítulo 22 - O choro pode durar uma noite...

Débora Borges

Apesar de tudo o que aconteceu, eu estava com as esperanças renovadas. Depois de chorar bastante e pedir a Deus uma resposta, um versículo bíblico lido depois de uma oração acalmou meu coração: “O choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã” (Salmo 30:5). Eu sabia que Deus não iria nos desamparar e que aquela situação não ficaria assim. Estava contando para uma amiga que trabalhava comigo na creche que eu não sabia quando nem como o Michelson e eu iríamos ter nosso próprio lar, depois de termos perdido todas as economias naquele “golpe do apartamento”. Além disso, meu salário mal daria para pagar um aluguel, e o Michelson também ganhava tão pouco que não seria suficiente para cobrir nossas outras despesas. O jeito era continuar morando com minha família, até conseguir um emprego com salário mais alto e que nos permitisse continuar sendo fieis a Deus e aos Seus mandamentos.

Uma amiga que estudava a Bíblia conosco estava inconformada e perguntava por que Deus não nos ajudava. Então falei o que realmente estava sentindo naquele momento: “Servimos ao Deus da Bíblia. Ele é todo-poderoso e nos ama todo o tempo. Entregamos a vida a Ele e cremos que Ele está nos guiando pelo caminho certo. Nada nos acontecerá sem que Ele permita. Ele está vendo tudo, e sinto que Jesus tem planos diferentes daqueles que fizemos, mas que ainda são desconhecidos para nós. Se tudo o que planejamos desse certo, nossa vida teria outro rumo. Agora não estou vendo uma saída, mas confio em Deus. Tenho certeza de que Ele vai nos ajudar.”

Na verdade, o que mais nos incomodava era aquela sensação de falta de realização pessoal. Nosso trabalho era nobre e eu estava descobrindo a satisfação de educar crianças. Mas o Michelson tinha aspirações que não silenciavam dentro dele. Ele sonhava e buscava meios para utilizar na obra de Deus seus dons e conhecimentos jornalísticos. E, é claro, como marido provedor, nos dar condições financeiras para formar nossa família e ter independência. Era uma questão de dignidade.

Pouco tempo depois, fui chamada no meio da manhã para atender ao telefone na secretaria da creche. Era meu esposo e eu estranhei aquilo. Era a primeira vez que ele ligava para lá. Devia ser importante. Ele estava feliz e disse sem rodeios:

– O que você acha de morarmos em Tatuí?

– O quê?! – eu falei, rindo do entusiasmo dele.

– O pastor Rubens Lessa, da Casa Publicadora Brasileira, me convidou para fazer uma entrevista e um teste para uma vaga de editor.

Parecia um sonho. Eu não conseguia avaliar direito o que estava acontecendo nem imaginar como nossa vida iria mudar.

Quando ele estava em Tatuí, fazendo o teste, ficamos incomunicáveis, pois celulares não eram populares (e não podíamos ter um), não havia e-mails e eu não tinha telefone. Ah, como seria bom se já existisse Skype ou WhatsApp! Fiquei ansiosíssima esperando o retorno dele. Quando ele chegou, nos abraçamos demoradamente, sentindo a mão de Deus nos abençoando e conduzindo nossa vida de uma forma surpreendente. Em nosso olhar, era como se disséssemos um para o outro: “Eu sabia que Deus nos ajudaria.”

O Michelson estava eufórico como uma criança, enquanto contava cada detalhe de sua visita à CPB. Ele me disse que tudo era lindo lá: os jardins, os escritórios, o parque gráfico. E a cidade também.

Aquele mês transcorreu com a nossa rotina normal. A correria e o estresse do dia a dia me davam a impressão de que o dia da nossa mudança estava tão distante, ou que talvez nunca acontecesse. Mas tudo foi muito rápido. Quando chegou a notícia de que meu esposo havia sido aprovado no teste, tínhamos apenas uma semana para estar em Tatuí, pois o Michelson precisava começar a trabalhar em breve.

Um mundo novo me esperava e eu não estava pronta para ele. Emoções e sentimentos que eu nunca havia experimentado tomaram conta de mim. Eu me sentia como uma menininha de cinco anos de idade que iria ficar longe da mamãe. Estava totalmente insegura e parecia que eu não conseguiria fazer nada longe da minha mãe. Era uma dor muito forte ficar sem ver o rosto dela por tanto tempo. Sem poder receber seu carinho, seu abraço confortador nas horas difíceis.

Eu realmente não sabia o quanto havia sido mimada. Meus pais haviam me criado com o foco nos estudos, e eu achava que jamais seria dona de casa. Simplesmente não pensava nisso, antes de conhecer meu marido. Minha mãe não exigia que eu ajudasse nas tarefas domésticas, para que eu tivesse tempo de estudar e brincar; e mais tarde, na adolescência, comecei a trabalhar como bolsista da escola em que meu pai lecionava. Talvez ela quisesse me poupar do que sofreu e me dar uma vida totalmente diferente da dela. É claro que de vez em quando eu dava uma ajudazinha na limpeza, mas não o suficiente para estar preparada para cuidar de uma casa.

Ao chegar a Tatuí, meus olhos estavam ofuscados pela dor da perda. Eu queria estar feliz como o Michelson, mas não conseguia vencer a saudade, a insegurança e o medo do desconhecido. Olhei para a cidade do alto de sua entrada principal e ela me pareceu horrível. Era alaranjada, como se estivesse envolta em uma nuvem de poeira laranja. Eu contrastava aquela imagem com a minha última visão de Florianópolis, ao sair de ônibus da rodoviária. O céu azul, os raios do sol refletidos no mar como um espelho, gaivotas voando em frente a um barquinho de pesca igual ao do meu pai. Aquela cena era tão familiar que, para mim, passava despercebida. Mas agora eu achava que era a mais linda do mundo – e eu teria que viver sem ver o mar no horizonte. Isso me fazia sentir que estava muito longe de casa.

Hoje eu amo minha cidadezinha de Tatuí. É incrível, mas só penso em ir embora daqui se Jesus nos revelar que tem planos para nós em outro lugar. Caso contrário, quero morar aqui até que Ele volte e nos leve para o Céu.

Eu sabia que Deus queria que estivéssemos ali, mas esperava que Ele fizesse alguma coisa para aliviar minha dor. E Ele colocou pessoas amorosas em nosso caminho. Estávamos procurando urgentemente uma casa para alugar. Então, uma funcionária da redação da CPB prontamente se dispôs a ajudar. Mais do que fazer várias ligações, a irmã Ildete me transmitiu tanto carinho e acolhimento, que ela me deu forças para acreditar que eu ainda ficaria feliz.

Vimos várias casas, mas o que determinou nossa escolha foi conhecer a Charlotte. Em frente à casa dela havia uma casa pequena para alugar. Ela conhecia os donos daquela residência de meio lote e estava com as chaves dela. Batemos à porta da casa da Charlote e, quando ela se abriu, ouvimos um “olá” muito animado e vi o maior sorriso que já tinha visto, tudo acompanhado de um forte abraço. Ela nos tratou como se já nos conhecesse havia muito tempo e estivesse nos esperando. Ela era muito alegre e fez a maior propaganda do bairro. Era perto do centro da cidade e eu poderia ir a todos os lugares a pé, já que não tínhamos carro. Era bem arborizado, tranquilo, silencioso e com uma boa vizinhança. E o melhor de tudo: seríamos vizinhas, e ela se ofereceu para me apoiar no que eu precisasse. Se ela soubesse o quanto eu estava carente, talvez não tivesse dito aquilo, porque eu me apoiei mesmo!

O detalhe é que ela era esposa do chefe do Michelson, o pastor Lessa. Os dois foram mais do que amigos e ajudadores para nós; foram verdadeiros irmãos em Cristo. Não podia existir chefe melhor. Algumas vezes, ele até nos ofereceu seu carro para que pudéssemos sair, ir à igreja. E ela me deu dicas preciosas de culinária. Além de orar comigo constantemente e enxugar minhas lágrimas.

É maravilhoso esse amor fraternal da família de Cristo! Aonde quer que vamos, podemos contar com o apoio e o afeto dos irmãos que também amam Jesus e compartilham da mesma fé. Se não fosse isso, não sei se teria suportado o sofrimento.

*****

O dia em que chegamos a Tatuí com a nossa pequena mudança foi um dos mais frios daquele ano. Chegamos de ônibus antes do caminhão e entramos na casa ainda vazia. Era feriado de 1º de maio de 1998. O pastor Lessa e a Charlotte estavam viajando e passamos sozinhos nosso primeiro fim de semana na cidade.

A maioria dos nossos pertences – que eram presentes de casamento – permaneceu encaixotada, pois não tínhamos onde guardá-los. Possuíamos apenas uma cama e um fogão (presentes de casamento), uma TV velha que pertencia ao Michelson, uma escrivaninha e uma estante com livros. Felizmente, aquela casa tinha guarda-roupas planejados. Na segunda-feira, fomos procurar uma geladeira para pagar em parcelas.

Como também não tínhamos mesa nem cadeiras, fazíamos as refeições sobre uma caixa de papelão em cima da cama. E foi assim por alguns meses.

Nossa primeira "mesa"

Para mim, o aprendizado mais difícil foi enfrentar o tanque de roupas. Sem máquina de lavar, eu esfregava todas as roupas sujas. A pele fina das minhas mãos esfolava e chegava a sangrar. Por isso, eu só lavava roupas nas segundas-feiras, para dar tempo de cicatrizar as feridas e eu poder esfregar as roupas novamente. Até tentei usar luvas, mas não consegui me acostumar. Preferi calejar as mãos e ficar mais “forte”.

Eu gostava de olhar para as roupas lavadas e penduradas no varal, e me orgulhava de que eu mesma tinha lavado tudo aquilo.

Ao ver o quanto eu me sentia sozinha e triste, o Michelson sugeriu que eu fosse até uma loja agropecuária que havia perto de casa e verificasse se havia um filhote de cachorro para doação. Ele sabia que eu gostava muito de cachorros e que também estava sentindo falta dos três que tinha deixado na casa da minha mãe.

Naquele dia, não havia nenhum filhote, mas no dia seguinte o dono da agropecuária me ligou e passou o endereço de uma família que morava ali perto e que estava doando cachorrinhos com apenas 25 dias de vida. Eram oito filhotinhos para eu escolher. Estava indecisa, mas o senhor idoso pegou a menorzinha e disse que ela parecia um pinscher. Nem rabo ela tinha; era só um “toquinho”.

Então a aconcheguei em meus braços e a levei para casa. Ela não parava de tremer. Por isso, envolvi-a com vários panos de lã, pensando que ela estava sentindo frio. Depois descobri que ela tremia sempre que ficava nervosa. A Laila, como a chamamos, foi uma grande companheira e dona de uma “personalidade” forte. Agitada, bravinha, medrosa, carinhosa. Ela foi muito importante em minha vida e nunca vou esquecer nossos doces momentos e da ligação de amor que tínhamos. Ela ficou conosco por 14 anos e morreu em 2012, por causa de um tumor na boca. Aquele seria um dos dias mais tristes de nossa vida.


Nossa cachorrinha e grande companheira Laila
Aonde eu ia, a Laila me seguia. Nunca me deixava sozinha. Muitos dias eu só tinha ela com quem conversar face a face. Mas o Michelson me ligava várias vezes durante o dia, para saber como eu estava e falar que me amava. E esse hábito nós conservamos até hoje – todos os dias ele me liga só para dizer que me ama, e eu também retribuo as ligações.

Ele estava tão feliz e realizado que eu me recriminava por estar tão triste. Eu falava com Jesus o dia inteiro. Naquela época, aprendi a depender mais de Deus e nossa amizade se tornou muito mais sólida. Eu gostava de ouvir músicas que me faziam sentir a presença de Jesus, e sobre a cama eu contemplava o céu que aparecia através da porta do quarto. Ali eu imaginava Jesus olhando para mim.

Nesses momentos de oração e contemplação, pedi que Jesus fizesse algo para demonstrar que me ouvia e me amava. Que Ele me desse um “telefonema” no meio do dia, só para me lembrar: “Filha, Eu te amo. Você não está sozinha.” Eu sabia disso por meio da leitura da Bíblia, mas, mesmo sabendo, é gostoso ouvir “eu te amo”.

Então, certo dia, li uma história sobre como Jesus alegrou o coração de uma mulher acamada, fazendo algo simples, mas, ao mesmo tempo, improvável. Quando li aquilo, disse para Ele: “É isso mesmo! É isso que eu quero que o Senhor faça para mim também. Eu vou gostar.” Foi tão marcante! Desde então, Jesus me “liga” de vês em quando para dizer que me ama e que está me vendo. É como se tivéssemos um sinal secreto que só nós dois entendemos. Em momentos de angústia, provação e tentação, Ele me enviou esse sinal de maneira tão clara e evidente, que seria impossível eu não reconhecer Sua providência.

*****

Meus sentimentos de confiança e otimismo haviam mudando depois que deixei minha vida em Santa Catarina. E era isto mesmo o que eu sentia: que minha vida havia ficado lá, e em Tatuí estava só o meu corpo. Mas Deus é paciente e bondoso. Ele não muda e permanece fiel. Ele sabia que eu teria que passar por muitas coisas ainda, para aprender a confiar e ser feliz novamente. Enquanto eu sofria e vacilava, Ele esteve ao meu lado o tempo todo, aperfeiçoando meu caráter e moldando meu coração. Assim como minhas mãos tiveram que ser calejadas, eu também tive que sofrer para me tornar mais forte.

Mesmo tendo nos mudado para um lugar dentro do mesmo país, senti dificuldades para aprender a nova cultura local. Depois de cometer algumas gafes e ser alvo de olhares recriminatórios, acabei aprendendo lições importantes de convivência.

A primeira dificuldade veio quando fomos comprar pão na padaria. Meu sotaque era muito diferente da forma de falar do interior de São Paulo. Tinha que repetir umas cinco vezes o que eu queria, falando devagar e, às vezes, apontando o dedo. Além do problema do sotaque, havia também a questão do vocabulário. O pão, por exemplo, tinha nomes diferentes.

Aproximei-me do balcão e pedi:

– Quero cinco pães de trigo.

A balconista ficou me olhando sem entender nada. Então o Michelson riu de mim e disse, como bom criciumense:

– Cinco pães d’água, por favor.

A moça continuou sem entender nada. E foi a minha vez de rir. Então, corrigi:

– É pão francês.

Mas a moça continuava confusa. Então ela apontou o dedo para o pão e nos perguntou:

– É desse filãozinho que vocês querem?

– Isso! É o filãozinho! – falei, animada.

Ainda bem que logo aprendi a fazer em casa um pão integral que, modéstia à parte, é delicioso.

Mas o pior foi ter que me adaptar à crendice da “lombriga inteligente”. Eu conhecia muitas crendices da minha terra (região de pescadores, lembra?), mas nunca tinha ouvido falar nessa. Já, já explico.

Quando eu era criança, minha mãe me ensinou a nunca aceitar nada de estranhos: balas, doces ou qualquer alimento. Acho que por precaução e por higiene, para a nossa segurança (minha e de meu irmão). Além disso, mesmo quando visitávamos a casa de amigos e parentes, recebíamos muitas recomendações para não pedir comida, pois isso seria uma “falta de educação”.

Por isso, quando era criança, desde cedo aprendi a ter certo domínio sobre o apetite, e tínhamos que saber esperar para comer na hora certa. Além disso, tinha que ser a comida que fosse autorizada pelo “controle de qualidade” dos pais. E isso não era só na minha família. Era uma questão cultural mesmo. Sempre ouvia pessoas criticando crianças que viviam comendo na casa “dos outros”. Se eu fosse brincar na casa de uma amiga, no momento em que era anunciado o almoço, eu já sabia que era hora de correr para minha casa. É claro que às vezes comíamos na casa de amigos, mas sempre com a permissão dos pais e somente quando éramos convidados.

Então, ao chegar a Tatuí, fui surpreendida por um costume totalmente diferente. Há uma crença de que todas as crianças têm lombrigas e que elas, as crianças, são obrigadas a comer tudo o que têm vontade, senão as lombrigas “se revoltam” e podem até matar as crianças. Isso é tão sério que todos ficam preocupados. Se uma criança simplesmente olhar para alguém que esteja passando na rua comendo alguma coisa, essa pessoa nem pergunta se a criança pode comer aquele tipo de alimento e já lhe oferece um pouco.

Alguns chegam ao ponto de permitir que a criança experimente bebida alcoólica, para que ela sinta o gosto e não fique com vontade, caso contrário, ela pode adoecer! Fica “lombrigada”.

Não demorou muito para que eu tivesse meu choque cultural em relação a esse assunto em particular. Sofri muito para entender por que minhas atitudes em relação à alimentação e ao domínio próprio não eram bem aceitas – pior, eu parecia ser cruel e insensível para alguns tatuianos. Com o tempo, aprendi a respeitar as diferenças e passei a evitar atritos. Mas em nossa casa procuramos seguir as leis de saúde e ter domínio sobre as “vontades”, para não deixar que elas nos dominem. (Ah, e já fizemos exames e não temos lombrigas.)

*****

Eu me sentia diferente e desnorteada. Não sabia mais quais eram os meus objetivos e uma tristeza muito forte não me deixava fazer planos para o futuro. Passava a maior parte do tempo sozinha, pois havíamos decidido frequentar a igreja de uma cidade vizinha chamada Boituva, uns 30 km de Tatuí. Por isso mesmo, eu quase não conhecia irmãos que moravam em Tatuí, muito menos gente da minha idade e que tivesse as mesmas afinidades.

Acho que escolhemos aquela igreja porque ela tinha características semelhantes às daquela que frequentávamos em Santa Catarina: era pequena, simples, estava em construção e nos sentíamos úteis ali. Os irmãos eram acolhedores e estavam precisando de líderes, pois o primeiro-ancião deles havia falecido pouco tempo antes, em um acidente. O pastor Lessa e a Charlotte também frequentavam aquela igreja e prestavam auxílio lá. Eles nos davam carona, o que acabou estreitando nossa amizade.

O ano estava chegando ao fim e eu não queria passar o ano seguinte só chorando e cuidando da casa. O Michelson me incentivou a estudar para prestar o vestibular e entrar na faculdade. Eu queria cursar Psicologia, mas não havia esse curso em Tatuí. O mais viável seria cursar Pedagogia, o que também despertava meu interesse.

– Mas como vamos pagar a faculdade? – perguntei, meio incrédula. O que sobrava do salário do Michelson naquela época não daria para cobrir a metade do valor do curso.

– O Senhor proverá – foi a resposta confiante do meu marido. – Sempre que eu precisei, Deus enviou os recursos. Ele vai nos ajudar.

No primeiro mês, pagamos a matrícula e a mensalidade, e ficamos no vermelho. Tivemos que pedir dinheiro emprestado para comprar comida. Mas não poderíamos continuar assim nos meses seguintes, senão a “bola de neve” só iria crescer. Eu precisava trabalhar. Estava aflita e orava ao Senhor, quando o telefone tocou. Era a diretora da Escola Adventista me chamando para começar a dar aulas naquela tarde!

Terceiro ano do curso de Pedagogia
Era uma unidade de educação infantil, que funcionava em uma casa alugada no centro da cidade. Minha classe era bem pequena e os alunos tinham entre dois e quatro anos. Eles eram bem educados e obedientes e muito amorosos. Nos afeiçoamos rapidamente. Eu saía da escola correndo, passava em casa e corria novamente para a faculdade, onde ficava até às 23 horas.

Parecia que tudo estava dando certo. Eu me relacionava bem com os alunos e os pais deles, apesar de que ainda tinha muito para aprender sobre educação e pedagogia. Mas acho que não tinha tanta habilidade para me relacionar com as colegas de trabalho. Meu jeito e minha cultura não se enquadravam no que elas esperavam, e eu não tinha experiência para perceber no que precisava mudar.

No fim do semestre, a diretora me falou que era melhor eu fazer uma “retirada estratégica” e voltar quando estivesse mais preparada. Fiquei muito magoada na época, e minha autoestima foi lá embaixo. Estava com vergonha de chegar em casa e dar a notícia ao Michelson. É claro que chorei por muitos dias.

Para terminar de pagar a faculdade naquele ano, pedi que me dessem um desconto se eu pagasse tudo de uma vez. Para isso, utilizei o dinheiro da rescisão do contrato com a escola e o fundo de garantia. Assim, as mensalidades daquele ano estavam pagas; e o próximo ano estava nas mãos de Deus.

Algum tempo depois, a Charlotte me convidou para trabalhar na escola de educação especial que ela havia fundado e administrava, a Associação Cristã de Educação Especial (Acede). A filha caçula dela tem deficiência mental, e como não havia em Tatuí uma escola com princípios cristãos especializada em educação especial, a Charlotte decidiu criar esse ambiente para a filha e, ao mesmo tempo, ajudar outros pais.

Eu não me sentia preparada para ensinar àquelas crianças e resisti um pouco, mas acabei indo. Os recursos eram escassos, pois poucos pais de alunos podiam contribuir financeiramente, e a escola era mantida por meio de doações. Éramos quase voluntários, pois recebíamos uma pequena ajuda de custo. Todos faziam o melhor que podiam, e a Charlotte nos custeava alguns cursos de especialização em educação especial.

Foram anos de grande aprendizado, em todos os sentidos, principalmente no aspecto emocional. A alegria e as lutas daquelas crianças com tantas limitações mudaram minha maneira de encarar a vida. Comecei a ver como todos nós somos imperfeitos de maneiras diferentes, e precisamos uns dos outros. Somente quando Jesus voltar todas as marcas que o pecado deixou serão eliminadas.

Meus alunos e eu gostávamos de ficar planejando tudo o que faríamos ao chegar ao Céu, e orávamos todos os dias para que Jesus voltasse logo. Hoje, alguns deles já estão dormindo na sepultura, aguardando inconscientes o dia em que Jesus vai chamá-los pelo nome e levá-los para casa, com um corpo e uma mente perfeitos e capazes de fazer tudo o que sonharam, e muito mais. Eu quero vê-los correndo em direção a Jesus e pulando nos braços dEle. Depois, iremos brincar juntos com nosso querido Salvador.


Meus alunos na Acede

*****

Deus estava provendo a cada ano o que precisávamos. Providencialmente, consegui conversar com o dono da faculdade e ele me concedeu um bom desconto, deixando a mensalidade pelo mesmo valor que eu ganhava trabalhando na Acede. Assim, consegui chegar ao último ano sem dever nada.

Em junho daquele ano de 2001, cheguei em casa depois das aulas e não conseguia dormir. Estava passando mal e pensei que alguma coisa que eu havia comido no lanche da noite não tinha me caído bem. O dia seguinte era feriado e passei o tempo todo na cama. Achei que devia ser uma virose. Pedi ao Michelson que fosse à farmácia comprar algum remédio. Ele já estava saindo, quando senti Deus me falando ao coração:

– Que tal fazer um teste de gravidez?

– O quê?! Será possível? – estranhei.

Só então é que me dei conta de que fazia tempo que eu não menstruava. A correria era tanta que nem prestei atenção a esse “detalhe”.

O Michelson voltou rapidamente da farmácia, aplicamos o teste e logo surgiram os dois risquinhos na fita do teste de urina, indicando POSITIVO!

Foi a maior emoção da minha vida! Nós iríamos ter um bebê!

1 comentário:

Anónimo disse...

Uau! Que história! Me identifiquei com vários momentos que vocês passaram e tenham certeza que Deus falou comigo através da história de vocês.
Obrigada e continuem escrevendo... Estou ansiosa pelos próximos capítulos rs